Vivendo e Pedalando.
Estou elaborando esse pequeno texto há algum tempo, relacionando fatos e momentos pelos quais passei. Essas são minhas memórias recentes e estão ligadas a minha relação com a bicicleta e com o SP Gay Bikers.
Em algum momento na minha vida me vi perdido (aha que novidade!), não pertencendo a grupo nenhum, meio à deriva. Já tinha feito anos e anos de terapia e resolvido um monte de questões, mas essa sensação de desorientação ainda perdurava e vez por outra, dava as caras.
Posso parecer um pouco piegas ou desconectado do cenário que os gays encontram hoje, mas minha saída do armário foi tardia, reflexo de anos de repressão sexual e auto-formatação num padrão que eu percebi indo à falência na medida em que minha vida corria.
Um dia recebi um convite, ainda no velho e empoeirado Orkut, para fazer parte de um grupo de gays que gostavam de andar de bicicleta. Respondi ao convite e depois de alguns dias combinamos nosso primeiro encontro na Praça Siqueira Campos, em São Paulo.
Com reticência, e muito em dúvida do que encontraria, fui ao local combinado e conheci outros que buscavam parceiros para pedalar por São Paulo. Isso há 5 anos . Daí começamos a pedalar e se formaram laços de amizade com experiências e pontos de união entre os participantes. Essa história muitos já conhecem, mas o que está por trás disso (da minha parte) é o que trago agora.
Aquela sensação de desorientação do começo do relato foi o que me levou a me relacionar com aquele grupo que se formara. Lembro-me que quando pequeno (menor ainda), eu adorava andar de bicicleta pelo bairro. Conhecia cada viela da City Lapa, cada parque e cada lombada.
Invariavelmente, depois da lição de casa, eu pegava a bicicleta e pedalava pelo bairro. E hoje, morando numa cidade nova, ainda com pouca familiaridade pelos bairros e ruas, entendo como me fazia bem a sensação de liberdade, de interação com a cidade, de conexão com cada grafitti nos muros, cada árvore, cada casa demolida ou nova construção.
Hoje tenho certeza que quando respondi ao André Hidalgo, para ir ao primeiro passeio do SPGB, eu buscava aquela velha sensação de liberdade e o acolhimento num núcleo de pessoas com as quais podia ser eu mesmo, sem máscaras ou dúvidas. Eu estava procurando onde me encontrar, e isso aconteceu pedalando com gays como eu.
O SP Gay Bikers tem pra mim uma importância muito maior do que o trajeto que fazemos, o fato de não termos regras sedimentadas ou um perfil padrão de participantes. É a minha expressão de liberdade e de fazer parte do mundo. E me sentir em casa. Talvez por isso eu tenha tanta saudade.
Lendo a última edição especial da revista Vida Simples, me deparei com um texto sobre aprender e ensinar a andar de bicicleta, e esse trecho abaixo, que reproduzo aqui, expressa um pouco do que sinto pedalando por aí:
“A bicicleta é então ferramenta para se conquistar muita coisa: equilíbrio, movimento, controle de si, cuidado com o outro, confiança.
Mais: aprender a olhar a cidade, se relacionar com ela e seus espaços em outra perspectiva. Aprender isso desde pequeno pode determinar outra relação com a vida”
Trecho do texto de Mariana Lacerda para a edição especial da revista Vida Simples - De Bike é Mais Gostoso.
Kiko, achei seu texto lindo e sincero !
ResponderExcluirAcredito que todos nós em algum momento das nossas vidas já estivemos em meio a escuridão e falta de perspectivas por ser quem somos.
Isso já está resolvido para muitos de nós e para outros talvez ainda não e a resposta virá com o tempo.
Pedalar com o SPGB faz com que as lembranças desse tempo sejam tão distantes e sem importância que nem lembro que um dia existiram.
Sou muito grato a esse grupo e espero sempre fazer parte dele!
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